Um dos principais blogs de política do Brasil, do Ricardo Noblat publica o artigo do presidente da Embratur Flávio Dino sobre o vergonho caso do deputado Donadon. Acompanhe:
O
Direito, como técnica de organização da vida social e de solução das
controvérsias, busca permanentemente a superação de antinomias. Para
isso servem os diversos métodos de interpretação jurídica, entre os
quais está o método lógico.
A votação da Câmara, ao não atingir o
quorum constitucional de deliberação para perda de mandato do deputado
Donadon, conduz a resultado ilógico, destituído de razoabilidade. Basta
indagar: é possível a um cidadão condenado criminalmente a regime
fechado exercer um mandato parlamentar por telepatia ou por e-mail ?
O
sistema jurídico não possui lacunas absolutas. Sempre haverá uma regra
jurídica aplicável, que supra o aparente vazio normativo. Assim,
parece-me que há dois caminhos para a Câmara sair do labirinto em que,
infelizmente, se meteu.
O primeiro, é considerar que neste caso
não há preclusão consumativa, já que estamos diante de um ato
administrativo discricionário ( e não de um ato integrante do processo
legislativo). Ou seja, como não houve a formação de maioria absoluta,
podem ser feitas novas votações, mediante provocação fundamentada de
qualquer partido político representado no Congresso Nacional,
repetindo-se o procedimento com ampla defesa.
Por simetria, é como
se a votação – ao não atingir o quorum de maioria absoluta em qualquer
dos sentidos – fosse equivalente a uma sentença que extingue o processo
sem julgamento do mérito (não produzindo coisa julgada material). Há
precedentes no Senado de repetição de votações, no caso da apreciação de
nomes indicados a cargos que exigem aprovação parlamentar como condição
de investidura.
Outro caminho está na incidência do artigo 55,
inciso II, da Constituição. Afinal, é óbvio que um parlamentar
condenado por crimes graves e a penas elevadas, recolhido a
estabelecimento penal em regime fechado durante o mandato, incide em
procedimento incompatível com o decoro parlamentar. Neste caso, não se
debate o momento do cometimento dos crimes, e sim o instante do início
da execução da pena em regime fechado como caracterizador da quebra de
decoro.
Pode ter fato mais indecoroso do que um parlamentar
impedido de modo absoluto de exercer suas funções, por estar em regime
fechado em uma penitenciária?
Qualquer uma das soluções supera uma
contradição fática que não pode prevalecer, e é mais compatível com o
princípio da moralidade do que a concessão de licença a parlamentar em
tão esdrúxula situação. Vale destacar: deputado licenciado, deputado é.
Flávio Dino,
professor de Direito Constitucional (UFMA), Mestre em Direito Público
(UFPE), foi juiz federal (1994-2006) e deputado federal (2007-2011),
quando integrou a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara.
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